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CARTA POLÍTICA | Margaridas de Pernambuco: Donas de si, JUNTAS pelo fim da violência!

A violência contra as mulheres é fator estruturante nos sistemas patriarcal, racista e capitalista que só se mantêm vivos com a opressão, com a dominação e com a discriminação das mulheres. Essa manutenção de poder se dá a partir do controle dos corpos e dos territórios das mulheres utilizando a violência como forma de silenciar suas vozes.

O avanço do fascismo vem aprofundando as suas raízes e tomam conta do Estado Brasileiro com forte incidência em todos os poderes, aumentando ainda mais a situação de vulnerabilidade das mulheres. Nesse sentido, podemos destacar casos emblemáticos que tiveram grande repercussão social este ano. Um caso foi o da criança de 10 anos que foi violentada no Espírito Santo, teve sua identidade violada e sofreu um ataque de fundamentalistas para impedir o seu direito de salvar a própria vida e o da promoter catarinense Mariana Ferrer, que foi estuprada e após tratamento desumano no tribunal, teve o caso julgado como estupro culposo, gerando revolta e uma intensa mobilização contra o judiciário e a cultura do estupro.

Infelizmente, esses casos não são raros, vivemos em um país onde 1 mulher é assassinada a cada 2 horas e no Estado de Pernambuco, fazendo o recorte de raça, 80,4% das mulheres vítimas de homicídio são negras (Atlas da Violência, 2020). Em nossa sociedade, 536 mulheres foram vítimas de agressão física a cada hora em 2019, 42% dos casos ocorreram em casa e pouco mais de 18% das vítimas procurou uma delegacia e 52% não fizeram nada.

Essa triste realidade retratada nos dados oficiais, infelizmente, ainda é insuficiente para evidenciar a situação de violência contra as mulheres que vivem no campo, nas águas e nas florestas, em uma complexa teia de aspectos culturais, sociais e econômicos que se entrelaçam de forma marcante e, muitas vezes, as silenciam de forma brutal. Esses fatores envolvem a condição geográfica de distanciamento dos sítios, engenhos e comunidades, precariedade no acesso à informação, inexistência ou insuficiência de políticas públicas de prevenção e de enfrentamento à violência contra a mulher, e fortemente, uma cultura patriarcal presente e reproduzida nas famílias do campo que impõem uma “naturalização” da violência contra as mulheres e meninas.

Além da violência física, as trabalhadoras rurais enfrentam uma série de violências simbólicas e materiais, pois, mesmo sendo responsáveis por 45% da força de trabalho produtivo agrícola no país e por mais da metade da produção de alimentos consumidos pelas famílias da agricultura familiar (FAO), elas sofrem historicamente com a invisibilização e desconsideração de suas contribuições produtivas e econômicas no campo.

Com a chegada da pandemia do coronavírus, que agravou as desigualdades sociais e econômicas no campo, as mulheres vêm sofrendo com a sobrecarga do trabalho, o que tem efeitos sobre a saúde física e mental e, consequentemente, aumenta a vulnerabilidade das mulheres rurais às situações de violência. Organizações e movimentos sociais do campo relataram um aumento dos casos de violência doméstica contra as mulheres em Pernambuco, ligado ao aumento do tempo de convivência com os seus agressores, a interferência na autonomia sobre suas atividades e seus corpos e ao aumento do consumo de álcool e outras drogas.

Desde o início da história de organização das mulheres rurais em Pernambuco, a violência é uma pauta permanente e, através de muita luta, mobilização e ampla participação nos espaços políticos, protagonizando importantes movimentos como a Marcha das Margaridas, tem conquistado vários avanços que nos últimos tempos estão sob ameaça ou exterminados.

O Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares defende e luta para construir um Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário estruturado, entre outros elementos, no enfrentamento às estruturas de poder e cultura patriarcal e por justiça, autonomia, igualdade e liberdade para as mulheres e na Plataforma Política da Marcha das Margaridas de 2019 reafirmamos nossa luta pelo fim do racismo e da violência contra as mulheres e pela garantia de nossas vidas.

Por isso, neste 25 de novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, instituído oficialmente pela Organização das Nações Unidas (ONU) e ao longo dos 16 Dias de Ativismo, o nosso compromisso é com a luta pelo fim todas as formas de violência contra as mulheres. Viemos reafirmar que lutamos por:

•Ampliação dos equipamentos públicos de acolhimento e proteção à mulher, em especial na área rural;

•Implementação integral da Lei Maria da Penha estabelecendo punições mais severas em casos de violências contra a mulher (incluindo casos de violência em redes sociais);

•Acesso das mulheres do campo, da floresta e das águas a todos os serviços da rede de atendimento e proteção social, ampliação da capilaridade do atendimento a essas mulheres por meio da capacitação dos serviços especializados e não especializados da rede de atendimento à mulher em situação de violência (em especial, os da rede de saúde e da rede socioassistencial), uma vez que os municípios de pequeno porte, principalmente, não possuem centros especializados. O CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) e CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) devem ser estruturados para atender a essas situações;

•Formação de profissionais da área da Assistência Social na perspectiva de gênero e raça, mas, pautada também na realidade do campo, da floresta e das águas, quilombos e outras, para que não reproduzam estereótipos sexistas;

•Desenvolvimento de campanhas de enfrentamento à violência contra as mulheres e adolescentes junto às escolas rurais (escolas de assentamentos, quilombos, escolas itinerantes e outros serviços da rede pública de educação do campo, da floresta e das águas);

•Ampliação e fortalecimento de políticas que contribuem para a eliminação da desigualdade de gênero, etnia e raça, incluindo processos educacionais e de formação que desnaturalizem a divisão sexual do trabalho destinada exclusivamente às mulheres;

•Inclusão da escola como um equipamento na rede de enfrentamento à violência contra a mulher e a criança e que nos seus currículos sejam inseridos conteúdos relativos às questões de igualdade de gênero e racial;

•Construir uma Política Integrada com as Secretarias de Governo, como a da Mulher, da Saúde e da Educação para a inclusão de estudos e ações pedagógicas sobre temas como Enfrentamento a Violência Contra as Mulheres – políticas e controle social, Divisão Justa do Trabalho Doméstico, com olhar para as especificidades do meio rural nas Escolas Estaduais de Ensino Integral criando novos Núcleos de Gênero e fortalecendo os existentes;

•Garantir o acesso das mulheres aos insumos e às informações sobre os contraceptivos e contracepção de emergência, por parte das mulheres do campo, da floresta e das águas;

•Constituir e executar políticas de geração de renda para as mulheres rurais para proporcionar autonomia econômica, diretamente ligada a redução da vulnerabilidade das mulheres no campo a situações de violência;

•Promover a auto-organização das mulheres nas comunidades e Sindicatos de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares como um espaço fundamental de luta contra a violência à mulher.

Tentarão nos matar, tentarão nos calar, mas não conseguirão. Resistiremos e seguiremos em marcha para desconstruir essa cultura patriarcal e pelo fim de todas as formas de violência, fortalecendo os espaços organizativos de mulheres no MSTTR e ampliando a ocupação dos outros espaços de incidência política, como conselhos, redes e articulações entre movimentos e cobrando do poder público o cumprimento de seu papel de proteção e garantia de liberdade a todas as
mulheres.

Somos Margaridas, Donas de si e seguiremos JUNTAS pelo fim da violência!

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