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Notícias
Agricultores familiares da Mata Sul de PE denunciam ameaças de empresas e latifundiários
Site: Jornalistas Livres
Por Thais Fonseca
agosto 20, 2020
CONFLITO AGRÁRIO
Famílias de comunidades agrícolas da Zona da Mata Sul de Pernambuco estão vivendo o drama de serem expulsas das terras onde vivem e de onde tiram o sustento, ameaçadas por grandes latifundiários, que querem ocupar as áreas rurais para produção pecuária. São comunidades produtoras de agricultura familiar que ocupam essas áreas há pelo menos 40 anos. Algumas dessas comunidades existem há 90 anos.
Distantes quilômetros da rodovia e isolados no meio da mata, onde não se tem um sinal de telefonia, as famílias vivem acuadas por grandes empresários latifundiários que agem na surdina instalando cercas e mantendo a comunidade amedrontada. É o que destaca a Federação de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Fetape), entidade sindical que representa e coordena os trabalhadores rurais agricultores e agricultoras familiares no estado. O drama das famílias é acompanhado de perto por movimentos sociais que lutam pelo acesso à terra, como a Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 (CPT NE 2), além de parlamentares e secretarias do governo do Estado, de acordo com a Fetape.
Segundo os próprios agricultores, o objetivo é pressionar as famílias a deixarem a área, desocupando as terras para a criação gado. Uma das áreas de conflito é Batateiras, no município de Maraial, uma comunidade agrícola com área de 900 hectares e pertenceu a Usina Frei Caneca. As 50 famílias que lá vivem dizem se sentir acuadas por um empresário alagoano que afirma ter comprado as terras.
Enquanto algumas famílias resistem, outras já desocuparam o lugar com medo de serem mortas. Os relatos de medo foram contados quando a comitiva formada pela Fetape, CPT NE2, e o deputado federal Carlos Veras (PT/PE), visitaram Batateiras, no último dia 14 de agosto.
“É uma coisa muito grave. Nós sobrevivemos dessa terra. Todos nós somos agricultores. Estamos aqui de mãos amarradas. Não temos como sair pra rua pra vender coco, banana, laranja. Ele destruiu tudo. E agora no Dia dos Pais trouxe uma carta para a gente abandonar as casas em até 30 dias. Não sabemos o que fazer”, relatou um dos agricultores à comitiva.
A ocupação dessas famílias na condição de agricultores familiares se deu após falência das usinas onde trabalhavam, ou eram credores, e que nunca receberam indenização. É o caso do Engenho Roncadorzinho, no município de Barreiros, que foi propriedade da Usina Central Barreiros, atualmente uma Massa Falida sob administração do Poder Judiciário, que o arrendou. A comunidade existe há 40 anos e abriga cerca de 400 moradores, sendo 150 delas crianças. Nos últimos anos, a comunidade vem sofrendo diversas ameaças e violências pela empresa Javari, com destruição de lavouras e com contaminação das fontes de água e cacimbas do imóvel, através da aplicação direcionada e criminosa de agrotóxico de alta toxidade, também segundo a Fetape.
O deputado federal Carlos Veras (PT/PE) afirmou que buscará denunciar o caso em nível nacional e internacional. “Vamos levar para a Comissão de Direitos Humanos, vou tentar agenda com o prefeito. Vamos levar esse caso para nível internacional”.
Municípios de Catende e Jaqueira também enfrentam conflitos agrários
A situação se repete em outros municípios da Zona da Mata Sul onde usinas foram desativas. Em Jaqueira uma reunião foi realizada com a comunidade na semana passada, quando se somaram à comitiva o arcebispo da Arquidiocese de Recife e Olinda, Dom Fernando Saburido, e o bispo auxiliar Dom Limacêdo Antonio, os deputados estaduais Doriel Barros (PT) e Isaltino Nascimento (PSB) e o prefeito de Jaqueira, Marivaldo Andrade.
Agricultores da comunidade do Engenho Fervedouro, também em Jaqueira, e da comunidade Pau D’Óleo, em Catende, relataram episódios de violência enfrentados por eles, que resistem e permanecem nas terras, onde os conflitos acontecem desde o ano de 2017, quando uma empresa se instalou na região. São ações de destruição da plantação e de cercas, uso de drones para vigiar a movimentação das famílias, entre outras violações de direitos humanos.
“Tenho medo de ir até no rio lavar uma roupa. Vivo a base de remédio controlado. Fervedouro não é mais o que era quando eu era criança. A gente não tem segurança de sair de dentro de casa para respirar um ar livre. Meu marido sai para trabalhar e eu vivo com medo. Minha mãe se mudou para morar comigo porque eu não tenho mais condições de viver sozinha. É medo de ficar sozinha dentro de casa”, relatou uma jovem mulher da comunidade.
“A empresa chega e aterroriza porque também temos um presidente da república que é contra o trabalhador e a trabalhadora, porque para o presidente esse povo não tem direito à terra. Mas, vocês são herdeiros da luta do povo do Quilombo dos Palmares, que viveu nesta região. E como eles, tenho fé que esse povo vai se levantar e vai lutar contra o inimigo”, pontuou Plácido Junior, coordenador da Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 (CPT NE 2).
A comunidade foi visitada nesta quarta-feira (19), por uma comitiva formada pela Fetape através da diretoria de Política Agrária, acompanhada da CPT, secretarias de Direitos Humanos e de Defesa Civil, Defensoria Pública e acompanhados de batalhão da Polícia Militar de Palmares. A visita caminhou pelas áreas de conflitos para realização de um levantamento da situação junto às famílias.
Agricultura familiar: produção que alimenta o Brasil
A Agricultura Familiar é a principal atividade responsável pela produção dos alimentos que chegam à mesa do brasileiro. Ela é constituída de pequenos produtores rurais, povos e comunidades tradicionais, assentados da reforma agrária, silvicultores, aquicultores, extrativistas e pescadores, segundo informações no site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
É considerado agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, com mão de obra da própria família. O Censo Agropecuário de 2017 aponta que a agricultura familiar empregava mais de 10 milhões de pessoas, o que representa 67% do total de pessoas ocupadas na agropecuária. A atividade também foi responsável por 23% do valor total da produção agropecuárias.
*Com informações da Federação de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Fetape).